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Corte epistolar a propósito de “Quando se reúne muito trabalha-se pouco” – as várias performances de Gustavo Sumpta.

“Um metro é um metro” e nada mais. É isso que nos diz a razão e o título de um trabalho teu. As coisas claras aparecem-nos como um facto, uma evidência, no seu sentido literal. Reducionistas? Não, porque podemo-nos colocar a questão: o que é que pode um metro? Volta-se ao mesmo mas com outros olhos – sabendo que são os olhos que também o fazem, porque não voltamos a olhar o que temos à mão? Pegas no metro, coloca-lo em cima de um papel dourado, e esse gesto não me parece nada contraditório já que associas então essa medida da razão à economia do valor simbólico implicada na ciência, na arte e em toda a nossa vida. Parece-me que estás a trabalhar com uma certa simbólica do transcendente mas tu sabes que, quando o transcendente não tem em conta as pessoas concretas, torna-se um tipo de economia terrível e por isso procuras a economia que tenha em conta a existência concreta do movimento e das particularidades de cada um de nós e de cada ocorrência.

É uma mudança de perspectiva. Literalmente, com os teus desenhos isso acontece: da ocidental para a Japonesa. Que abuso fazer de ti um japonês…Tu que dizes que a japonesa não te interessa a não ser por ser concentrada naquele que a vê e naquele que a produz. O que te interesse, e o que me interessa a mim, é o facto de teres a possibilidade de estar onde estás a fazer o que fazes, tu que tens ligações mais claramente biográficas com África e com os vários recantos das principais cidades e das periferias portuguesas.
Então, não é a perspectiva japonesa que te vem mudar as ideias és tu que vais ao encontro dela porque compreendes que ela te serve para a tua vida, para as tuas instalações, para as tuas performances. Voltemos então à questão do “centrada naquele que a vê e que a produz”: pode parecer haver aqui um hedonismo. Mas agora, quem vê sou eu, logo, quem produz sou eu também. E ao meu lado está outro espectador, e outro, e outro, e esta perspectiva cria em todos eles um centro e então, quando os expões, os trabalhos que fazes ganham a sua autonomia.

Não estou de acordo que da performance não devem ficar vestígios. Deve se com o “não devem” que não estou de acordo. Podem ficar e podem não ficar. O teu trabalho não quer tratar de vestígios, de imobilização de movimentos, de arranjos de memórias ou lembranças mas sim de pontos de encoragem da existência a qual pode acontecer antes e depois dos objectos. Porque vivemos num mundo a 3 dimensões precisamos dessas ancoragens (e lembra ou lê, o poema da poeta polaca Wislawa Szymborsk, quando agradece aqueles que não ama, porque “é mérito deles / que eu viva em três dimensões, /num espaço não lírico e não retórico (com um horizonte real porque movente. / Eles próprios ignoram/quando trazem nas mãos vazias.”). Por outro lado, falas bem contra a perspectiva que nos traz o trompe l’oeil. O perigo do regresso da performance é o de se transformar em trompe l’oeil: representar um mundo em 4 dimensões em 3, ter uma função distractiva ou dar a ver como uma promessa algo que pode ser construído.

“Só a violência funciona, onde a violência impera”: citaste-me isto de alguém dizendo que tinha razão mas eu não estou de acordo contigo. Talvez se possa também inverter a determinação da energia do dínamo. É por isso que me interessa a arte. Ela têm esse lado indeterminado que faz com que tu possas dizer uma coisa sobre ela e eu outra. Não é que todos valem a mesma, porque senão, mais valia não fazer nada, mas é uma questão, se não de perspectiva, pelo menos de estratégia… O que é faz este desenho… o que é que faz esta pintura… o que é que faz este gesto… o que é que nós fazemos, não deles mas, com eles?

Podia-te ter inserido numa espécie de genealogia das práticas performativas. Podia definir e justificar bem qual o lugar da tua prática na definição de uma ideia de arte da performance e explicar em que medida, ao fazeres uma exposição, cumpres os requisitos de seres um artista performativo mas, a escrita sobre arte, a escrita da estética, não tem de ser somente sobre isso. Pode falar de outras coisas que não a arte ela mesma e não deixa mesmo assim de falar de si. Porque assim, estaremos a aceitar na arte a sua função performativa: a de que ela nos faz qualquer coisa,

Não sei porque precisas de um crítico para te escrever um texto. Já sei porque é: porque não se pode fazer tudo sozinho e porque são precisas pessoas para que os acontecimentos, as ideias e as conversas fluam. Porque a performance não é desempenho mecânico nem alguém num espaço isolado. É um sistema de nos apercebermos do movimento e das potencialidades das coisas que nos envolvem e é isso que eu acho que tens andado a fazer.

Liliana Coutinho

Publicado a 19 de Janeiro de 2007

20
Jan
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17
Mar
Isabel Ribeiro, "Uns minutos antes", 2006

Isabel Ribeiro, "Uns minutos antes", 2006

Artistas: Andreia Brandão, Artur Duarte, Isabel Ribeiro, João Fonte Santa, Joseph Kosuth, Rui Silvares

Entre os dias 20 de Janeiro e 16 de Março de 2007 reuniram-se na Plataforma Revólver obras dos artistas Andrea Brandão, Artur Duarte, Isabel Ribeiro, João Fonte Santa, Joseph Kosuth e Rui Silvares.
Para que conste na presente acta, ficou previamente acordado que Isabel Ribeiro irá expor duas obras Uns Minutos Antes (2006) e Rubor (2006) e os restantes participantes uma obra, respectivamente: Andrea Brandão, sem título (2007), Artur Duarte, S/Título [Apagado] (2007) João Fonte Santa O Cavaleiro Fantasma (2003), Joseph Kosuth One and Three Radiator (1965) e Rui Silvares, Aid El Quebir (2006).
Foi deliberado que a ideia de montagem/edição iria unificar toda a práctica desta exposição.
O artista/comissário João Fonte Santa disse:
“Ver um curador em cada esquina faz-nos lembrar que também a arte está sob apertada vigilância… Decrescente Fértil é uma exposição que é pela edição e contra o controlo policial (comissário-burocrático).
Nada mais a Dizer
Tudo a Fazer!”

Mesmo havendo mais assuntos a tratar, foi encerrada a referida sessão da qual foi lavrada a presente acta.

Publicado a 19 de Janeiro de 2007