6
Abr

se não me engano, faz Angola
SÉRGIO B. GOMES

A viagem por Angola não tinha destino traçado. Mas Jordi Burch e Ondjaki acabaram por rumar a Sul. E desse deambular vieram imagens fotográficas e palavras em forma de poema que dão corpo à exposição se não me engano, faz Angola, na Plataforma Revólver, em Lisboa
Os fantasmas e os corpos invisíveis habitam os poemas de Ondjaki. Nas fotografias de Jordi Burch, os corpos (e os rostos) vão aparecendo desmaterializados ou muito carnais, um pouco como tese e antítese das palavras escolhidas pelo poeta. Pelo meio, ainda, o fotógrafo fixou o olhar na paisagem de céus carregados, que ora vão surgindo tingidos de laranja avermelhado, ora de verdes muito escuros. O diálogo entre estes dois homens e estas duas artes foi potenciado por uma viagem, a convite do Instituto Camões de Luanda, de mais de 2500 quilómetros por Angola, que aconteceu muito ao sabor da deriva geográfica e do encantamento pela forma como tomamos os lugares e os tornamos nossos. E quem olha para este casamento feliz entre as palavras e as imagens, que se distanciam mais do que se cruzam, como nos amores platónicos, o que encontra também são sinais cúmplices, como naquelas amizades fortes em que basta um leve aceno para que o outro perceba logo o que se está a passar.

Para a exposição se não me engano, faz Angola, que pode ser vista na Plataforma Revólver, em Lisboa, até 2 de Maio, Jordi Burch (fotógrafo do colectivo kameraphoto radicado em São Paulo, Brasil) escolheu 18 imagens onde se intui o prazer pela viagem (sem mapa) e pela descoberta (sem condicionamentos?). “A ideia era estarmos juntos, viajando de carro (finalmente de carro…) por uma Angola que nos apetecesse, munidos do ritmo humano de uma amizade que acabávamos de inventar. Com o percurso aberto, afinal — fomos descobrindo… — rumamos para sul”, explicou a dupla na apresentação desta exposição no Museu Afro Brasil, São Paulo, primeira paragem onde foi mostrada.

Aproveitando o potencial do inesperado na viagem, Jordi tentou manter-se o mais longe possível dos sujeitos fotografados, uma opção que aproxima as suas imagens de um ideal apolítico, à procura da utopia do olhar virgem, puro. “Tentei não entrar demasiado no espaço das pessoas. Mantive-me longe”, disse numa conversa de chat com a Revista 2 na qual se mostrou convicto de que “as pessoas naqueles lugares são mais elas quando vistas de longe do que quando são vistas de perto”. De perto do fotógrafo, “que vem de outro lugar”, condição que “transforma o comportamento de quem é fotografado”. Desta convicção nasceu ainda outro desafio visual que passa por “obrigar” quem vê as ampliações a preto-e-branco (que não são mais do que pormenores de pessoas presentes nas fotografias a cores) a distanciar-se, isto se quiserem perceber um pouco melhor os vultos que se soltam nas imagens.

Neste jogo, a imagem esbate-se, deixa de ser o mais relevante, como nota o fotógrafo Martim Ramos (também do kameraphoto) num texto a propósito deste trabalho: “Esqueceste os nomes dos sítios e os rostos dos outros e que o mundo é redondo, porque isto já é sobre outra construção, é coisa que vem de dentro. Espremeste a vida com o olhar e ficou isto. (…) Aos poucos, desses lugares que inventas, acenam-me motivos que reconheço doutras paragens. Lembro-me das coisas que mais gosto e sinto-me preso ao que me rodeia e não sei se isto me faz bem ou me faz mal. Mas, definitivamente, não é de fotografia que se fala aqui.”

Talvez não seja mesmo de fotografia que se fala aqui. Pode ser mesmo “coisa que vem de dentro”. De lugares onde, mais do que outra coisa, reina o silêncio.

in Jornal Público (P2) ed. 6 abril 2014
http://www.publico.pt/multimedia/fotogaleria/se-nao-me-engano-faz-angola-332712

Publicado a 6 de Abril de 2014

2
Abr

PT/// A Plataforma Revólver recebeu Ana Rosa Hopkins no Edifício Transboavista, no âmbito da residência artística da primavera 2014. Entre abril e maio a artista realizou trabalho específico para o espaço Plataforma Revólver HOTEL. A residência da Ana Rosa Hopkins na Plataforma Revólver, em Lisboa, criou a possibilidade da artista reunir diferentes ideias sobre as quais a sua prática se centra e se confronta; mas permitiu também a exploração e o uso de matérias e objetos que a artista nunca havia antes desenvolvido.
A exposição no espaço HOTEL foi a ocasião perfeita para a artista trabalhar no contexto da cidade de Lisboa, na pesquisa dos ambientes que vivenciou, o que lhe permitiu a utilização e articulação – em boa parte – dos materiais agora apresentados em permanente diálogo com as suas ideias e a sua prática conceptual. Quer isto dizer que a residência permitiu à artista refletir sobre a prática no local (site-specific), através de uma noção mais abrangente da produção artística e também de se interrogar sobre o fazer e sobre os diferentes significados do ‘fazer’. Fazer qualquer coisa, não importa com que objecto ou material, foi a ideia desenvolvida no âmbito desta exposição apresentada em Lisboa, no Hotel da Plataforma Revólver.
É caso para dizer que a artista britânica, estabelecida em Manchester, encontrou recordações de outra natureza no contacto e na sua relação com a história da cidade de Lisboa, que influenciaram com sinceridade o seu espírito e a sua prática, ao longo do período de quatro semanas da sua permanência ininterrupta no Transboavista.

Biografia
Ana Rosa Hopkins (nascida em Córdoba, Argentina) é doutoranda no MIRIAD (Instituto de Investigação e Inovação em Arte e Design), na Manchester Metropolitan University intitutlado “The back-story in contemporary sculptural practice: material, history and action and the legacy of Joseph Beuys”. Tem apresentado os seus trabalhos em exposições individuais e coletivas, entre Alemanha, Finlândia, Portugal, Espanha e Brasil. Tem recebido diversos prémios no Reino Unido e em 2013 foi artista convidada na Ebenbockhaus, pelo Município da cidade de Munique. Em 2014, foi premiada com residências e exposições na Plataforma Revolver, Lisboa e a Real Fábrica de Cristales de La Granja, Segóvia, Espanha.

A residência na Plataforma Revólver realizou-se com o apoio do Edifício Transboavista, da MIRIAD e da Câmara Municipal de Lisboa.



              Vista da entrada na exposição THINK | ACT | FORM de Ana Rosa Hopkins (UK) na Plataforma Revólver HOTEL



EN /// Plataforma Revólver is pleased to host Ana Rosa Hopkins in the Transboavista building for the spring artist residency program me. Between April and May the artist presents series of new specific works for the Plataforma Revólver HOTEL.
The residency for Ana Rosa Hopkins at Plataforma Revólver in Lisbon gave her the opportunity to bring together different ideas around the focus and challenges of her practice; but also allowed the exploration and use of materials and objects which the artist had never worked with before.
The exhibition at the Plataforma Revólver HOTEL was the perfect moment for the artist to work within the context of the city of Lisbon and explore the environments she experienced, allowing her in many of the works to express a constant dialogue between the materials used and her ideas and conceptual practice. This means that the residence allowed the artist to reflect on the site specific through a broader notion of artistic production and to question the making process and the different meanings of ‘making’. The idea developed in the context of this exhibition presented at Hotel Plataforma Revólver, Lisbon was to do anything, no matter with what object or material. That is to say that the British artist currently living in Manchester came across other types of memories in her contact and relationship with the history of the city of Lisbon, which strongly influenced her spirit and practice over her four weeks uninterrupted stay in Transboavista.

Biography
Ana Rosa Hopkins (born in Córdoba, Argentina) is currently undertaking a PhD by Practice in MIRIAD, Manchester Institute for Research and Innovation in Art & Design at Manchester Metropolitan University entitled “The back-story in contemporary sculptural practice: material, history and action and the legacy of Joseph Beuys”.
She has presented her work in solo and group exhibitions, including Germany, Finland, Portugal, Spain and Brazil and has received several awards in the UK. In 2013 she was a guest artist at Ebenbockhaus in Munich at the invitation of the Municipality. In 2014 she was awarded residencies and exhibitions at Plataforma Revólver, Lisbon, and the Real Fábrica de Cristales in La Granja, Segovia, Spain.

This residency program at Plataforma Revólver was supported by Transboavista, MIRIAD and Câmara Municipal de Lisboa.

Publicado a 2 de Abril de 2014